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Audiência destaca avanços e falhas em políticas públicas para a Síndrome de Down

Publicado em 20 de março de 2014 às 18:29

Os avanços e as falhas em políticas públicas destinadas a pessoas com Síndrome de Down foram tema de debate nesta quinta-feira (20) na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). Entre os avanços, o que foi mais destacado foi o atendimento prestado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) às pessoas com a síndrome, considerado o melhor do mundo. Por sua vez, a educação ainda deixa muito a desejar, segundo os convidados da audiência.

A audiência, requerida pela presidente do colegiado, senadora Ana Rita (PT-ES), que não pôde estar presente, foi presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS). O debate foi marcado para celebrar o Dia Internacional da Síndrome de Down, comemorado no dia 21 de março.

Falhas na educação
Para Elizabeth Tunes, doutora em Psicologia Educacional e professora da Universidade de Brasília (UnB), ainda há muito preconceito na sociedade e nas escolas devido à padronização do currículo e do ritmo de ensino. A professora defendeu uma legislação que assegure uma escola democrática.

– Por favor, pensem numa escola democrática verdadeiramente. É uma escola em que não há padronização de currículo, não há padronização de ritmo, o jovem estudante é atendido naquilo que é o interesse e a necessidade dele e não naquilo que a universidade definiu que tem de ser para passar no vestibular. Isso é um absurdo! Isso é manter os mecanismos da exclusão social – disse.

Na opinião de Lurdinha Danezy, fundadora da Associação de Mães em Movimento e uma das autoras do livro Cadê a Síndrome de Down que estava aqui? O gato comeu, é preciso repensar a postura em relação à diferença biológica das pessoas. Lurdinha cita o seu filho Lúcio Piantino – artista plástico que tem a Síndrome de Down e está expondo seus quadros na chapelaria do Congresso Nacional – como exemplo de uma mudança de olhar para a síndrome.

– A partir do momento em que a gente repensa essa postura em relação à diferença biológica das pessoas e começa a olhar para elas com possibilidades de desenvolvimento tão possíveis quanto as pessoas que não têm diagnóstico (de Síndrome de Down), essa pessoa tem uma possibilidade muito maior de ter um desenvolvimento – afirmou Lurdinha Danezy.

Ressaltando a importância de mudar o modelo da escola, ela contou que seu filho sofreu muito preconceito na escola pública. Lúcio ficou na escola até completar o ensino fundamental porque a família não aguentou o preconceito sofrido.

Helvia Flora Rodrigues relatou que ao saber, na gravidez, que esperava uma menina com a síndrome, teve de enfrentar a sugestão de aborto dada pelo pai da criança. Hoje, ela disse se sentir privilegiada por ter Sofia como filha, mas confirmou que o preconceito e a falta de preparação das escolas traz sofrimento.

– Eu posso dizer, com propriedade e muita responsabilidade que, desde que Sofia nasceu, e ela está com 14 anos hoje, as reclamações são diárias e não mudam. Podem mudar as leis, mas a conduta das pessoas não muda – relatou.

A servidora do Senado Tatiana Guia contou que tem um filho com Síndrome de Down e outro com uma deficiência ainda sem diagnóstico. Para ela, as escolas não podem mais adotar o discurso de que não estão preparadas, coisa que ela ouvia há 20 anos quando foi professora.

– Quem não se preparou, que se prepare, porque os números estão provando que a deficiência existe, que ela não vai diminuir e as escolas têm que se preparar para isso – argumentou.
Se na questão educacional ainda é necessário melhorar muito as políticas públicas, em relação à atenção à saúde dos que possuem a síndrome o país se coloca em primeiro lugar no mundo, de acordo com o médico pediatra e doutor em Farmácia Zan Mustacchi. Para o médico, oportunidade é a palavra-chave para o desenvolvimento das pessoas com Síndrome de Down.
Progressos na saúde

Segundo Mustacchi, a população com Síndrome de Down no país está aumentando, porque as mulheres estão tendo filhos com idades mais avançadas. Se na década de 1990 havia cerca de 300 mil brasileiros com a síndrome, em 2014 há 432 mil. No entanto, a expectativa de vida dessas pessoas tem crescido. Na década de 1950, era de 15 anos, e, atualmente, está entre 60 e 70 anos de idade.
O deputado federal Romário (PSB-RJ), que tem uma filha com Síndrome de Down, afirmou que muitas coisas já melhoraram, apesar das falhas que ainda existem nas políticas públicas.

– Eu tenho certeza que, esse movimento como hoje aqui nesta comissão e outros que acontecerão aqui nesta Casa e no Congresso em geral e em muitos lugares no Brasil, hoje e amanhã, são movimentos que vão fazer com que as coisas continuem seguindo positivamente – afirmou o deputado.

Convenção de Haia
Presente na audiência, Eliana März, mãe de Helena, uma menina de 12 anos com Síndrome de Down, exibiu as medalhas obtidas pela filha em competições de ginástica artística. Eliana lamentou o fato de a Justiça de São Paulo ter dado a guarda de Helena ao ex-marido, que mora na Alemanha e do qual ela se separou por sofrer violência doméstica e por constatar que ele cometia abuso sexual contra a filha.

Eliana disse que é preciso mudar a aplicação da Convenção de Haia, utilizada pelo juiz que deu a guarda da criança ao pai. A convenção, da qual o Brasil é signatário desde 2000, diz que a criança tem de ir para o lugar onde ela estava quando o processo é iniciado.

– Eu vou cobrar uma mudança na aplicação da Convenção de Haia, na forma de um projeto de lei, que trate as crianças especiais de forma diferenciada – completou Eliana.