Romário quer acabar com limitações na medicação às pessoas com AME
Publicado em 10 de agosto de 2018 às 15:48
A paraibana Laissa Poliana Guerreiro representa com altivez seu sobrenome. A adolescente, que é ativista das causas das pessoas com deficiência física, foi diagnosticada com Atrofia Muscular Espinhal (AME) aos quatro anos. Hoje, aos 12, ela tenta sobreviver diante das decisões judiciais que barram a continuidade do seu tratamento, impedindo acesso ao medicamento “Spinraza”. Trata-se do único e eficiente remédio aprovado pela Anvisa, que pode salvar a vida dela e a de todas as pessoas atingidas pela AME.
Quando Laissa foi diagnosticada com a doença, o Ministério da Saúde não fornecia a medicação pela rede SUS, mas há pouco tempo depois ela recebeu duas doses da droga. Em seguida, uma decisão judicial suspendeu o fornecimento de Spinraza, que custa cerca de R$ 2 milhões – caixa com seis doses. A Justiça acatou os argumentos do Ministério da Saúde de que Laissa não pertence ao grupo de acesso à droga (crianças com até sete meses de idade), com eficácia comprovada no tratamento. Essa decisão contraria a indicação na bula do medicamento.
A medida equivale a uma sentença de morte. Frágil devido à doença, em sua cadeira de rodas, Laissa emocionou a plateia quando pediu, em lágrimas, que o desembargador que assinou a decisão, se colocasse no lugar das pessoas com AME:
“Gente! É muito ruim acordar e saber que pela falta do remédio morre-se um pouco todos os dias … É muito ruim sentir que se está perdendo um pouco da respiração e dos movimentos todos os dias, e isso quer dizer que a gente está morrendo. Ninguém pensa nisso? O que custa ao governo nos ajudar”?
O silêncio no auditório de 80 pessoas foi total, e lágrimas mostraram a emoção da plateia, inclusive do próprio senador Romário, comovido pelo desabafo e apelo de Larissa. Antes do final da audiência, Larissa fez breves movimentos com o seu corpo e braços, principalmente, demonstrando como havia melhorado depois de receber apenas duas doses de Spiranza, sinal de que a doença havia “estacionado”, comprovando a sua eficácia, como afirma a literatura científica sobre o assunto.
O que fazer?
Para discutir a situação da distribuição do medicamento às pessoas com Atrofia Muscular Espinhal (AME), o senador Romário presidiu uma audiência pública, na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, em 8 de agosto, reunindo representantes do Ministério da Saúde, do laboratório fabricante do medicamento, das associações de pacientes e das sociedades médicas, além de magistrados ligados ao tema e, claro, de pessoas que sofrem com a doença.
O foco da audiência foi ampliar o debate sobre a restrição ao medicamento e sensibilizar o governo sobre a necessidade urgente de liberar a sua compra, sob pena de ser responsabilizado pela morte de pessoas privadas de acesso à droga, devido o seu elevadíssimo custo.
Um protocolo do Ministério da Saúde recomenda que Spinraza seja administrado apenas para crianças com até sete meses de idade, seguindo os resultados do grupo clínico estudado, que orientou a ANVISA a liberar a medicação.
“A alegação é que essa faixa etária foi a única que participou de ensaios clínicos, o que contrapõe evidências demonstradas pelos pais de pacientes, pelas Associações que lutam pela causa, pela própria empresa farmacêutica fabricante do medicamento e pelos médicos especialistas presentes”, destacou Romário.
Para o neurologista Edmar Zanoteli, especialista em Atrofia Muscular Espinhal, o Ministério da Saúde devia ouvir os entendidos na doença e convidá-los a participar das decisões oficiais.
“Nós, médicos neurologistas, que trabalhamos com Atrofia Muscular Espinhal, entendemos perfeitamente a necessidade do medicamento para todos os pacientes com AME. Não há critério de exclusão. O critério de exclusão foi criado para montar um estudo clínico”, ressalta o médico que recomenda a medicação para os pacientes com AME em qualquer idade.
O médico disse, ainda, que a medicação pode estagnar a progressão da doença em qualquer idade. “Existem publicações recentes, na Alemanha e na Itália, provando que pacientes que não entraram nesses critérios (de idade) estão tomando o medicamento e estão melhorando”, reitera o médico.
Marcelo Gomes, diretor médico do laboratório fabricante da Spinraza (Biogen) explicou que o remédio enquadra-se num grupo chamado de “tratamento modificador da doença”, ou seja, não é um tratamento sintomático e sim reduz a progressão. Para o representante do laboratório muito tem se colocado sobre a necessidade de critérios nos estudos médicos, mas na própria literatura não se encontra nada que diga que em determinado grupo de pacientes a medicação não funciona. “Afirmar hoje em dia que um paciente com Atrofia Muscular Espinhal não se beneficie da medicação, não é verdade”, ressalta Gomes.
A única esperança
Emocionado com os depoimentos que ouviu, o senador Romário reafirmou o seu compromisso com a causa:
“No que depender de mim, eu vou fazer de tudo para que a gente possa dar o máximo de celeridade possível, para que seja feita uma lei totalmente a favor de liberar definitivamente esse remédio pelo SUS. Podem contra comigo esperar de mim esse trabalho até o final do ano”, disse Romário.
O senador encerou a audiência pública agradecendo os presentes e, ainda emocionado, declarou: “Vocês podem ter certeza absoluta que tem e sempre terão em mim um guerreiro nessa luta, independentemente da minha posição política”.
A omissão do governo
O médico oncologista Omar Ali Abdallah compareceu à audiência representando o Ministério da Saúde. Assessor técnico no Ministério, ele se retirou antes do final da audiência. Em sua manifestação, ele não justificou a ausência do ministro, Gilberto Occhi, nem as de outras autoridades do governo. E afirmou que o Ministério faz avaliações técnicas dos processos judiciais da mesma forma que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (Conitec) aplica critérios para incorporar medicamentos no SUS, isto é, para justificar os gastos.
Romário não deixou por menos e alfinetou o ministro ausente: “Infelizmente as pessoas não tem coragem de enfrentar os problemas de frente e aqui neste evento teria a obrigação de estar presente o Ministro da Saúde, mas ele não tem coragem. Infelizmente o Ministério da Saúde desdenha da gente, de vocês familiares e das pessoas que tem AME , mas eles tem que entender que aqui tem pessoas que vão lutar até o final”, bradou o parlamentar.
Ao final da audiência pública o senador Romário se comprometeu em enviar um oficio ao presidente da Conitec, com as notas taquigráficas e o vídeo da audiência, pedindo que a Comissão tome uma decisão positiva e abrangente pelo medicamento, levando em conta o que foi exposto por especialistas e laboratório fabricante da medicação.
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado